Observação: Qualquer semelhança com pessoas ou fatos reais terá sido (ou não) mera coincidência!

sábado, 20 de setembro de 2014

Orquídeas

Por volta de 19 horas, enquanto comia um saco de pipoca salgada e passeava pela papelaria namorando os tubos de  tinta a óleo  como uma menina  namora  sutiãs, batons, e saltos altos,   dei -me conta que era sexta-feira, e que, portanto, no dia seguinte bem cedo, após a xícara de café e sob a luz da janela da sala, minha sala, haveria mais orquídeas, daquelas a  lápis de cor que ando desenhando e pintando ultimamente. Sorri!

domingo, 14 de setembro de 2014

Paisagem a carvão

Vê-lo me causa ânsias de preencher o impreenchível com qualquer sentimento  insustentável, me arrancando do meu nada e me jogando com violência contra uma orquestra de tímpanos. Eu, que da vida só almejaria a contemplação silenciosa de alguma paisagem uniforme, vazia, e cinzenta, como os céus que desenho a carvão e cuja visão me devolve a paz momentânea, também insustentável, ilusão de quem só sonharia precisar de quietude e de silêncio.

domingo, 7 de setembro de 2014

Porque maldições, como espelhos, podem ser quebradas

Então veio de novo a vontade de escrever um monte de coisas, porque embora fale o tempo todo, raramente digo, e naquele domingo eu também não disse, não disse quando sua mãe falou do problema. Ela com a sua franqueza peculiar, sem que eu tivesse perguntado claramente, apenas com essa sensibilidade feminina de detectar o que “paira no ar”, ela falou do problema como ela o vê, que embora a menina goste de mim ela compete, porque eu sou uma ameaça, e que se você também vivesse aboletado na minha casa o meu filho teria problema com você. Eu não disse naquele momento que o menino não reclamou nem quando eu casei de novo, e que o menino não parece vê-lo como ameaça ou achar que você o usurpa de alguma forma, talvez por causa da minha família meio alemã com essa ideia de que os filhos devem construir suas vidas, que devem ser estimulados a cuidar de si. Eu não disse que acho  que o problema não é de território, que o problema é que a menina pensa que é sua mulher e que você não ajuda nada quando não atende os telefonemas e deixa ela ver, quando ouve ela dizer que é ela quem vai cuidar de você quando você estiver velho e age como se fosse natural ela falar assim , quando acha natural que ela fique o tempo todo grudada em você, você não ajuda. Sua mãe continuava a falar essas coisas de território enquanto eu pensava outras até que ela disse que é por isso que a menina não arranja namorado e eu concordei com a cabeça, embora ela ache que é por um motivo e eu ache que é por outro. Eu não disse a ela que não vivo aboletada na sua casa e nem te telefonando toda hora como se diz, e que se você está afastado da minha família não é  minha culpa ou porque o menino tem problemas de território. Também não disse que quando a minha irmã fez um churrasco pra comemorar o meu aniversario eu pedi umas três vezes que você fosse, mas você não foi porque a menina não quis, ou que no dia do meu aniversário você achou natural que ela quisesse determinar tudo que nós íamos fazer. Eu não disse também que pedi mais de uma vez  você fosse visitar meu pai no hospital . E no dia em que sua mãe achou estranho eu ter gatos e eu não disse o quanto é solitário dormir sozinha ao longo dos anos, e que eu não posso despejar minha carência afetiva no meu filho, porque ele precisa ter a vida dele e não se pode condenar os filhos à dependência e à solidão, porque vamos morrer e então o complexo de Édipo ou Electra ou o que valha não terá ajudado eles em nada.  Não disse nada ainda quando ela falou, se referindo aos limites impostos pelo que ela considera a questão territorial da menina e eu considero complexo de Electra além da idade, que foi isso que a vida me deu e que é com isso que devo me contentar. Não falei nada, mas cheguei a abrir a boca e depois fechar porque ela não entenderia e talvez lhe fizesse mal saber que algumas pessoas como eu jamais se contentam com o que a vida lhes dá quando a vida não lhes dá o que querem, porque pessoas como eu  aprenderam a buscar mais e a lutar, e a enfrentar o medo e o comodismo, e ás vezes precisam demolir algumas velhas construções confortáveis, porém insatisfatórias. Eu não disse quase nada, mas pensei na ultima frase de “Cem anos de solidão” em que Gabriel Garcia Marques escreve que as estirpes condenadas a cem anos de solidão não têm uma segunda chance sobre a terra, o que me faz lembrar de “Amor nos tempos do cólera”,  outra ode ao temor de viver  e à solidão, porque o que existe é apenas o presente, mas isso é uma outra conversa.

sábado, 26 de julho de 2014

Administrável

Foi quando ele disse aquela coisa, que grande parte das pessoas vivem sem amor. Estávamos falando do amor romântico, e eu com todas aquelas lágrimas que acompanham cada perda de ilusão, cada frustração. Foi ele também quem me disse uma vez que ninguém nunca me havia assegurado que o mundo era justo. Escrito assim, agora, parece tão óbvio e simples, mas quando se tem 20 e não se entende patavina das coisas, de como elas são, é uma revelação libertadora tanto quanto surpreendente. Tanto como essa, a das pessoas que vivem sem amor, essa trinta anos mais tarde.

 Talvez ele sempre tenha sido assim importante pra mim, desde a época em que fumava, roia as unhas e portava cachos com cor. Sempre alvo dos meus cuidados, olhares, escuta, admiração. Sempre o modelo da forma como eu iria educar meu filho, ainda assim no dia em que de verdade tive um. Ele e seus cachos com cor, o primeiro a me ajudar a pular os muros da medianidade, da mediocridade em que esta filha de normalista com militar, nascida em Niterói, vivia.  Então é isso, mais uma vez veio de sua boca a informação óbvia, de senso comum, que só a minha mente surrealartisticanovelescadorisday ainda não tinha. Uma nova informação daquele planeta distante, realidade, com o qual só um canal de muito afeto e confiança me fazia esporadicamente conectar. E, sabe, dita assim, por ele, de sua boca, através de seus olhos, pareceu até mesmo administrável!

terça-feira, 29 de abril de 2014

Sem você

Minha casa tem uma cara colonial. Brasileira, madeira, branco, azul. Na sala falta cortina, o banheiro precisa de jeito, ando habitando bastante a cozinha com copos, cremes, formas e morangos. O fogão tem saleiro de porcelana ao lado, com a palavra “sal”, que é pra não confundir. Vontade de encher a parte de cima da pia de azulejos coloridos... Em cima da mesa de centro, na sala, tem o meu retrato sorrindo, a foto da felicidade quando um dia me alcançou. Fica ali pra me lembrar.
Minha casa tem filho, planta, gatos, sofá branco, chão de taco, tapete de barbante, almofada xadrez. O quarto tem letras de musicas penduradas nas paredes, letras que combinam com o sorriso da sala, são pedaços dos meus sorrisos materializados. Tem livros, música, travesseiros, edredom. Minha casa é quente, minha casa é fresca, tem cinza, tem cor, castiçais, velas, moringa. Minha casa tem amor e tem dor, e tem fantasmas também.

Em 20 de dezembro de 2013

De repente meu mundo está enorme, maior do que pode caber dentro de mim, e o excesso pula de dentro pra fora do meu corpo e me faz doer os ossos e músculos. Tenho o corpo dolorido pelo excesso de pensar e os pensamentos me descem pelo pescoço e me dão a sensação de ter falado demasiado embora não tenha emitido palavra, uma noite de sono em um corpo relaxado e uma cabeça que não latejasse, que não transbordasse, seria terapêutica.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Em 7 de dezembro de 2013

A vida corre sonora e amorosa, um pouco de vinho uma cachacinha boa, árvores na penumbra da lua crescente, uma vontade de ter e papel e carvão pra capturar galhos pirilampos e cheiro bom, desses que não podem ser descritos, apenas sentidos e imaginados, um frescor de noite de verão na serra, o som, o som, e um amor que demorou a chegar, mas que como todas as coisas importantes que demoram, compensa cada minuto da espera, e essa vontade de guardar o momento para a eternidade ou algo mais próximo dela que se pode encontrar.