Observação: Qualquer semelhança com pessoas ou fatos reais terá sido (ou não) mera coincidência!

domingo, 7 de setembro de 2014

Porque maldições, como espelhos, podem ser quebradas

Então veio de novo a vontade de escrever um monte de coisas, porque embora fale o tempo todo, raramente digo, e naquele domingo eu também não disse, não disse quando sua mãe falou do problema. Ela com a sua franqueza peculiar, sem que eu tivesse perguntado claramente, apenas com essa sensibilidade feminina de detectar o que “paira no ar”, ela falou do problema como ela o vê, que embora a menina goste de mim ela compete, porque eu sou uma ameaça, e que se você também vivesse aboletado na minha casa o meu filho teria problema com você. Eu não disse naquele momento que o menino não reclamou nem quando eu casei de novo, e que o menino não parece vê-lo como ameaça ou achar que você o usurpa de alguma forma, talvez por causa da minha família meio alemã com essa ideia de que os filhos devem construir suas vidas, que devem ser estimulados a cuidar de si. Eu não disse que acho  que o problema não é de território, que o problema é que a menina pensa que é sua mulher e que você não ajuda nada quando não atende os telefonemas e deixa ela ver, quando ouve ela dizer que é ela quem vai cuidar de você quando você estiver velho e age como se fosse natural ela falar assim , quando acha natural que ela fique o tempo todo grudada em você, você não ajuda. Sua mãe continuava a falar essas coisas de território enquanto eu pensava outras até que ela disse que é por isso que a menina não arranja namorado e eu concordei com a cabeça, embora ela ache que é por um motivo e eu ache que é por outro. Eu não disse a ela que não vivo aboletada na sua casa e nem te telefonando toda hora como se diz, e que se você está afastado da minha família não é  minha culpa ou porque o menino tem problemas de território. Também não disse que quando a minha irmã fez um churrasco pra comemorar o meu aniversario eu pedi umas três vezes que você fosse, mas você não foi porque a menina não quis, ou que no dia do meu aniversário você achou natural que ela quisesse determinar tudo que nós íamos fazer. Eu não disse também que pedi mais de uma vez  você fosse visitar meu pai no hospital . E no dia em que sua mãe achou estranho eu ter gatos e eu não disse o quanto é solitário dormir sozinha ao longo dos anos, e que eu não posso despejar minha carência afetiva no meu filho, porque ele precisa ter a vida dele e não se pode condenar os filhos à dependência e à solidão, porque vamos morrer e então o complexo de Édipo ou Electra ou o que valha não terá ajudado eles em nada.  Não disse nada ainda quando ela falou, se referindo aos limites impostos pelo que ela considera a questão territorial da menina e eu considero complexo de Electra além da idade, que foi isso que a vida me deu e que é com isso que devo me contentar. Não falei nada, mas cheguei a abrir a boca e depois fechar porque ela não entenderia e talvez lhe fizesse mal saber que algumas pessoas como eu jamais se contentam com o que a vida lhes dá quando a vida não lhes dá o que querem, porque pessoas como eu  aprenderam a buscar mais e a lutar, e a enfrentar o medo e o comodismo, e ás vezes precisam demolir algumas velhas construções confortáveis, porém insatisfatórias. Eu não disse quase nada, mas pensei na ultima frase de “Cem anos de solidão” em que Gabriel Garcia Marques escreve que as estirpes condenadas a cem anos de solidão não têm uma segunda chance sobre a terra, o que me faz lembrar de “Amor nos tempos do cólera”,  outra ode ao temor de viver  e à solidão, porque o que existe é apenas o presente, mas isso é uma outra conversa.

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